Há alguns dias os profissionais de comunicação acompanham passo a passo a crise de imagem vivida pela Cacau Show. Muitos dedos apontados, muitas estratégias do que deve ou não ser feito circulam pelas redes sociais mas confesso que tenho uma única certeza nesse caso: quem está de fora não sabe exatamente o que ocorreu ou está ocorrendo.
Feita a ressalva inicial, analiso alguns pontos que considero importantes nessa crise e que podem servir de norte para outras empresas no que tange à comunicação, gestão e prevenção de crises reputacionais:
* Humanização nos dias bons, notas nos dias ruins: a Cacau Show é conhecida pela humanização e leveza da sua comunicação. O CEO, Alê Souza é o rosto da marca, inclusive é chamado por muitos de Willy Wonka brasileiro. A crise atual passa diretamente por ele, acusado de conduzir uma espécie de seita da qual os franqueados (e funcionários) eram obrigados a participar. O posicionamento para o público externo foi uma nota oficial (assinada pela empresa); para colaboradores e franqueados uma carta assinada por ele exatamente no dia em que o MasterChef exibiu o tradicional episódio patrocinado pela Cacau Show e com a presença do executivo.
Com uma crise tão forte e pessoalizada, seria importante Alê Costa estar mais presente nessa comunicação, gerando empatia e transparência para a conversa. A estratégia poderia incluir pronunciamentos em vídeo, entrevistas com veículos de imprensa selecionados para contextualizar a situação e responder a questionamentos, ou até mesmo transmissões ao vivo para interagir diretamente com os públicos e desmistificar as acusações.
* Cuide de todos os públicos. O cliente é importante? Sem dúvidas. Mas nesse caso a Cacau Show precisa acalmar e reconstruir a relação de confiança com seus franqueados, que são a linha de frente da marca e dependem da sua reputação para continuar as vendas. Não à toa, uma carta específica, assinada por Ale Oliveira, foi enviada para eles. Nela, ele reconhece as denúncias e o momento delicado, mas refuta as acusações com base nos valores e propósitos da empresa, “com uma comunicação aberta e transparente, para enfrentar desafios e celebrar conquistas”. Destaca os números, sua posição de líder no mercado de chocolates finos e planos futuros.
É essencial garantir que outros empreendedores continuem a se interessar em se tornar franqueados no futuro, demonstrando a solidez e o apoio da marca aos seus parceiros. E não pára por aí: os colaboradores também receberam um comunicado pedindo para que eles “não se deixem levar por boatos e informações distorcidas”. Para isso, ações contínuas de engajamento e diálogo com a rede de franqueados, como reuniões regulares, canais de comunicação exclusivos para dúvidas e feedback, e programas de suporte a vendas, seriam cruciais.
* Difamação pulverizada é estratégia. Reforço que não advogado para um lado nem outro nessa situação, mas há uma estratégia clara neste caso: pulverizar a difamação. As denúncias abordam diferentes pontos sensíveis e surgiram simultaneamente, dificultando a defesa institucional. A necessidade de responder a múltiplos pontos e gerenciar dezenas de veículos de comunicação e pontos de contato é um desafio imenso para os gestores.
Além disso, as denúncias geram o sentimento generalizado de desconfiança por parte do consumidor (o velho onde há fumaça há fogo), especialmente em épocas de informações falsa ou manipuladas. Além disso, ao serem repetidas diferentes vezes, tornam-se “verdade absoluta” sem a devida verificação dos fatos. E nós, profissionais de comunicação, sabemos que a acusação sempre rende mais do que a defesa ou esclarecimento dos fatos. Estratégia interessante poderia ser uma sala de imprensa no site, com informações sobre cada um dos pontos
* Publicidade é importante, mas nem sempre. Na véspera do Dia dos Namorados, fui impactada por poucos anúncios da marca, o que indica o tamanho da crise. O perfil da CS no Instagram tem evitado stories e publicou um único carrossel com um lançamento para a data. Na prática, as franqueadas devem ter prejuízo no Dia dos Namorados, uma das datas mais importantes para o setor. É provável que “dark posts” e remarketing estejam em andamento. Mas a campanha ostensiva parece que foi suspensa – o que considero um acerto em termos de comunicação para evitar mais espaços de comentários negativos. Ao mesmo tempo, é preciso monitorar com calma o momento certo de retomar as campanhas para não parecer insensível às reclamações dos franqueados.
A Cacau Show é uma empresa que construiu um forte capital reputacional ao longo dos anos, e Alê Costa é, sem dúvida, o rosto principal. Independentemente da veracidade das denúncias, a crise está impactando severamente esse capital reputacional que, nesse caso, irá se converter em prejuízos nas vendas.
A recuperação da imagem da Cacau Show exigirá um esforço significativo e contínuo. Existem dezenas de ações e estratégias que podem ser acionadas no plano de mitigação da crise, mas ainda é cedo para falar. O que é certo comentar é que a crise da Cacau Show é um lembrete contundente de que a gestão da reputação é um processo contínuo e que a transparência e a agilidade na comunicação são essenciais para navegar em tempos turbulentos.